Passados mais de 400 anos o governo brasileiro reconhece ser este um país de maioria negra- africana e o Dia Nacional da Consciência Negra como um dia de importância cívica nacional. Poderíamos dizer que por fim vamos nos tornando negros no esforço de sermos brasileiros de direitos. Cabe lembrar que a data de 20 de novembro foi transformada em Dia nacional da Consciência Negra, por proposta e articulação do Movimento Negro Unificado, MNU, em 1978.
A memória do sonho de liberdade de Zumbi se mostra vivo entre nós negros. Em parte porque carregamos o legado africano que construiu nosso país e, de outra parte, porque a data rememora a necessidade de seguirmos lutando. O racismo continua violando os direitos civis dos negros na diáspora. Basta ver o cenário de injustiça étnico racial em que as comunidades negras estão submetidas, em diferentes territórios da sociedade brasileira.
A situação dos quilombos no Brasil e, em particular em Minas Gerais, não é, em realidade, muito diferente de 500 anos atrás no Brasil. Temos assistido um silencioso massacre dos quilombolas, pelas empresas construtoras de hidrelétricas, e principalmente pelas mineradoras, que cada dia mais avançam com a exploração de minas, pilhas de rejeitos e resíduos tóxicos sobre os territórios quilombolas. Há o agravante do terror do racismo no espaço rural, com quilombolas ameaçados de morte, comunidades manipuladas ou coagidas para assinarem documentação de venda ou cessão de terras.
Retomando o passado, lembramos que o tráfico de africanos escravizados obrigou etnias de diferentes línguas a se assentarem em um mesmo local. Segundo Verger (2000), o tráfico de africanos retirava populações de todas as origens e de todas as “nações” e enviava seus navios com povos originários desde Cabo Verde, na costa ocidental, até Moçambique, na costa oriental. Ainda de acordo com Verger (2000), tudo os separava: a língua, os costumes e, algumas vezes, a cultura, que, para alguns, eram inimigas umas das outras. Outras vezes, a condição de exclusão e de ausência de direitos os unia, promovendo novos espaços de solidariedade e resistência, como quilombos, a capoeira, as escolas de samba o congado entre outros.
Apesar do tráfico de africanos, da migração forçada, a essência e os princípios norteadores culturais seguiram esses povos e seus descendentes, como é o exemplo das religiões de matrizes africanas tais como candomblé e umbanda. O pressuposto e a referência desses rituais são as plantas, ou melhor, “folhas”, como se costuma denominar os vegetais usados, in natura e frescas, nos terreiros de candomblé. As religiões de matrizes africanas possuem e compartilham “sistemas de curas” milenares, concebidos a partir da interação entre a natureza e o homem, a ecologia e a magia, mediadas pelas relações mitológicas.
Lamentavelmente temos assistido, no seio de algumas religiões com práticas fundamentalistas, de base judaica cristã, a reprodução e uso dos rituais de religiões de matriz africana, não só para esvaziá-los de sentido, mas para caracterizá-los pejorativamente como o sentido do mal- o Mal a ser exterminado. A leitura precisa desses discursos permite entender que querem dizer povos a ser exterminados.
É inadmissível que no terceiro milênio, século XXI, convivamos com práticas do período da Inquisição, considerando-se o crescente desrespeito e a perseguição religiosa com os cultos de matriz africana presente na sociedade brasileira. Uma sociedade que se promulga multicultural e democrática só poderá ser quando advogar a convivência respeitosa entre os seres dos diversos grupos humanos que compõem o tecido social, com plena liberdade de expressão religiosa e cultural.
O contraditório de tudo isto é que grande parte dos brasileiros quando adoecem do corpo ou da alma, com enfermidades graves, recorrem aos terreiros de candomblé ou umbanda para se tratarem. Portanto, a história das contribuições da cultura religiosa de matriz africana tem se mostrado um avanço na cultura DO BEM, DA CULTURA DA CURA. Os terreiros sempre foram verdadeiros exemplos de "hospitais" de prática de uma medicina da vida, integral e fitoterápica (cura pelas plantas). São instrumentos de políticas de saúde pública, e ao mesmo tempo espaços de retomada histórica de nossos territórios de liberdade, são referencias de sociedade multicultural.
Os quilombos são territórios de resguardo da Biodiversidade, celeiros da nossa história e escolas de diversidade cultural. Na cosmovisão de mundo negro-africana, tanto para os quilombolas, como para as comunidades de religiões de matriz africana, a terra é concebida como território de reprodução cultural vivo, e, portanto sagrado, ao contrario da lógica dos tecnocratas eurocêntricos, que vê a natureza apenas como fator de produção e lucro, matéria prima morta e os humanos como mercadoria e objetos de descarte.
Pode-se então tomar os saberes do candomblé, os saberes quilombolas e demais saberes negro africanos no Brasil, como saberes necessários ao ensino da ecologia, da medicina holística, da botânica, da geologia, da biologia, enfim das ciências integradas, dentro da sabedoria popular e da justiça sócio-ambiental. Nos terreiros e quintais quilombolas estão resguardados os sistemas de curas ancestrais que ligam o ser humano à vida na terra, e no cosmo, ou seja, a vida planetária.
Militantes e cidadãos, não podemos e não vamos permitir que o racismo nos submeta à violência simbólica e física, e que destrua o nosso legado ancestral e espiritual africano. Esse legado é libertário, ecológico e sagrado.
Nossa emancipação é a tomada da consciência negra, dos nossos direitos enquanto sujeitos de nossa história e da história nacional. Dedicamo-nos à construção de uma nação onde nossos filhos e netos possam crescer livres da perversidade do narcotráfico e de outras formas de crime organizado e da corrupção. Interferimos no cotidiano político nacional para que o sexismo e o racismo deixem de ser as barreiras para a expressão de todo o potencial de nosso povo e do conjunto dos brasileiros.
No Dia Nacional da Tomada da Consciência Negra o MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO-MNU mobiliza o conjunto social para a luta pelos nossos direitos e pelo projeto de se construir uma sociedade justa e igualitária de direitos. ZUMBI VIVE.
Pelo fim do racismo e pela garantia de nossos territórios de direitos. Reparações já.
MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO – MG
ÂNGELA GOMES – MNU –COORDENAÇÃO MG
DULCE PEREIRA – MNU – MG
Agradeço ao professor João Martinho que nos enviou esta matéria
Cris, boa noite!
ResponderExcluirLi esse comentário no Jornal o Tempo e resolvi mandar pra vc, pra Bia e pro Euler. Eu não sei do que se trata, mas, quem sabe pode nos ajudar....
Por favor, me responda. Um grande abraço.
Paty
"MARIA
bh
EXPERIMENTEM GRITAR NA TRIBUNA E NAS RUAS: NIÓBIO BRASILEIRO PARA A EDUCACÃO (OK NAO SOU BOA DE SLOGAM ISSO É C VCS) E VERÃO O PISO SAIR NUM PASSE DE MAGICA, A PALAVRA NIÓBIO É PROIBIDA NO PAÍS E EM MINAS PQ É MAIS VALIOSO Q OURO E ESTÃO NOS ROUBANDO DESCARADAMENTE E NENHUM GOVERNO FAZ NADA EM NOSSA DEFESA.EXPERIMENTEM E VERÃO A MÁGICA DO PISO INSTATANEO SAIR DA PROMESSA E VIRAR REALIDADE."
Muito bom. Só reassalto que este não é um país de maioria negra.
ResponderExcluirA proporção de negros no Brasil é de 7.61% … E o de “pardos” é de 43.13%… Isto daria mais de 50%, por pouco; mas incluem-se aí os caboclos (essa designação viu seu uso reduzido ultimamente, não?).
Aqui na Paraíba, por exemplo, os negros formam 3,96%, os brancos 42,59% — enquanto os caboclos (índios+europeus) são 52,29%…